sábado, 19 de junho de 2010

ainda que dentro de mim as águas apodreçam

sabe, eu sinto saudades tuas, uma saudade como se eu realmente tivesse te dito inteira um dia. não, não estou te cobrando nada, acho que essa inteirice que eu falo era completamente impossível na época, e nem digo isso pela distância, digo isso por mim mesma. eu não sabia ir fundo, eu não queria ir fundo. não sei se tu entende, mas eu tinha tanto medo que esse fundo fosse todo musgo, todo verde, que nem aquele conto do caio, sabe? de que eu fosse só um fundo sujo e feio. então não me atirava. não sabia eu que, quando a gente vai fundo o musgo é bom, a gente se entrega a ele. se tiver vontade, fica nele. se tiver sono, dorme lá. se tiver fome, come o musgo até. mas eu não podia, entende? e da mesma forma como não te acuso também não me desculpo. eu não podia ir mais fundo porque eu era um ser humano desforme, incompleto, meio oco. não exatamente oco, mas um tanto sem cor.
tou procurando a minha cor. tu vai dizer, o que isso tem a ver com as saudades do começo? eu te respondo: tudo. é procurando a minha cor que eu percebo o quanto tu faz parte dela. eu demorei muito tempo pra conseguir pensar sobre isso, porque de um tempo pra cá comecei a racionalizar tudo, e antes nunca tentava, queria só "sentir". agora entendi que sou um ser da cabeça, que só através dela chego no coração. então agora penso, agora sinto. tu faz parte da minha cor e é por isso que sinto saudades tuas. porque sei que seria uma cor mais brilhante contigo em mim, na minha vida. não sei se tu entende, sabe, não é um mais brilhante de porpurina, é um brilhante de reflexo do sol, vivacidade na cor, intensidade nela. o mesmo tom, a mesma cor, mas sem ti é menos tom, menos cor.
sinto saudades de um 'tu' que tu nunca foi. como aquela saudades de ter morado num lugar que na verdade nunca fomos, mas temos isso tão forte na cabeça que a saudade dessa ilusão é tão dolorida como se fosse de algo real.
então, todas essas voltas é porque eu quero te dizer que essa saudade é boa, sim. quero te dizer que sentir saudades é sentir estima por alguém, e admitir que preferia o perto ao longe, o contato conflituoso da presença ao olhar tranquilo de quem não se toca. quero te dizer que só sinto saudades porque te amei. e te amei de um jeito duro de amar, um amor só meu, áspero e forte e dolorido e fudido, sabe, e meu. era teu, também, esse amor. mas parece que eu só te dei a parte dura, que eu, como disse antes, tinha medo de sujar meus dedos no musgo e então me guardava inteira, sem perceber que já tava contigo tudo que fazia sentido guardar. te amei, e é essa saudade que dói, de ter ido até o fundo e não ter provado o musgo.
quando digo que procuro a minha cor é isso, porque finalmente entendi que só me sujando de musgo é que vou poder enxergá-la. e sei que tou perto disso, sei porque tem havido uma tranquilidade que anuncia esse encontro. hoje sou toda mar dentro de mim. ainda não descobri qual, mas a minha cor é feita de água. e é uma água que eu nunca vou me perdoar de não ter dividido contigo.

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